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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Por uma Segurança Pública Popular, Democrática e Comunitária



 Por Marcelo Buzetto*
É um grande desafio fazer uma introdução de um livro como este, principalmente por ter sido escrito por duas pessoas que convivem no seu cotidiano, com muitos dos problemas apresentados.
O esforço de Oséias Francisco da Silva e J. Burato é o de identificar os principais problemas enfrentados hoje por aqueles e aquelas que estão organicamente construindo uma proposta alternativa de Segurança Pública para o Brasil. Cada um deles, a seu modo, utilizando diversos espaços e instrumentos, estão participando de maneira ativa, consciente e organizada da luta dos trabalhadores e trabalhadoras que fazem parte das Guardas Civis Municipais em diversos municípios do país.
Iniciando por uma reflexão teórica profundamente humanista e preocupada em reconhecer que vivemos em uma sociedade profundamente desigual, marcada por lutas políticas e sociais que representam os interesses das classes que estão em luta, o livro resgata conceitos fundamentais da filosofia e das ciências sociais, além de nos presentear com um debate importante sobre a origem da violência policial e estatal na história do Brasil.
Levando em conta nossa “herança colonial”, que transformou a violência e a repressão contra os povos originários (“indígenas”), contra os negros escravizados e contra os pobres num elemento central do processo de construção nacional, Oséias e Burato conseguem demonstrar como ainda é presente nas instituições policiais e nas estruturas do próprio Estado o racismo e o preconceito contra a população trabalhadora, os moradores das periferias das grandes cidades, os sem terra, os sem teto, o meninos e meninas de rua, e outros setores da sociedade que se organizam e lutam contra o Estado, o Capital e os governos, que seguem, no Brasil atual, representando os interesses da classe dominante.
É importante, no interior do debate sugerido pelo título do livro, Segurança Pública como Projeto Sócio Educacional – A vocação, comunitária e popular da Guarda Civil, não esquecermos que o Estado segue sendo “a forma pela qual os indivíduos da classe dominante fazem valer seus interesses comuns”, “um comitê gestor dos negócios da burguesia”, um “instrumento de dominação de uma classe sobre a outra”. Essa definição, presente em inúmeros livros e textos de Karl Marx, Friedriech Engels e Vladimir Lênin continua atualizada, pois o que vemos no Brasil e em muitos outros países é um processo crescente e contínuo de repressão e criminalização dos movimentos de trabalhadores e trabalhadoras e suas lutas, tanto na iniciativa privada, quanto no setor público, ou em mobilizações por terra, trabalho, moradia digna, etc.
Quantas vezes os agentes de segurança pública não são convocados para monitorar e se infiltrar nas organizações políticas e sociais de esquerda, anticapitalistas, socialistas, nos movimentos sindical, popular e estudantil, convocados por superiores para “cumprir ordens” que tem como objetivo dispersar e reprimir uma mobilização de massas, capturar/prender lideranças, tudo isso ocorrendo com o “apoio da lei”, tudo “dentro da lei”, segundo os oficiais, comandantes, secretários de segurança pública, prefeitos, governadores e presidente.
Muitas lideranças de trabalhadores e trabalhadoras seguem sendo assassinadas, perseguidas, processadas e encarceradas, no campo e na cidade. O Estado brasileiro, como fiel defensor dos interesses da classe dominante, continua criminalizando os pobres, a pobreza e os lutadores e lutadoras sociais. Temos hoje nas prisões do Brasil, com mandados de prisão já decretados ou cumprindo sentenças judiciais arbitrárias e injustas, militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra-MST e de diversas outras organizações, o que evidencia o caráter de classe do poder judiciário, que tem sido um entrave para que sejam realizadas profundas transformações das relações econômicas, sociais e de produção no país.
É nesse emaranhado de lutas, conflitos e contradições, forças políticas e classes sociais, interesses econômicos e projetos/estratégias em disputa que também se situam os Guardas Civis Municipais, que são forçados pela própria situação econômica, política e social a se manifestar diante dos vários problemas que os cercam. No interior das Guardas, um setor mais ativo, consciente e organizado vem tentando, em todo o Brasil, se levantar para garantir para esta categoria de trabalhadores e trabalhadoras melhores salários, melhores condições de vida, plano de carreira, tratamento respeitoso e digno por parte do comando e dos oficiais, democratização da instituição diante do excessivo militarismo predominante nas relações de poder internas, etc.
Creio que este livro é resultado de um processo de mobilização movido por um legítimo sentimento de indignação diante das condições de vida e de trabalho na Guarda Civil Municipal. Essa combinação de reflexão teórica-política-ideológica com a participação direta na construção de uma experiência concreta de luta social é o elemento que diferencia esta publicação de outras.
Infelizmente, na esquerda brasileira e mundial, e nos movimentos de trabalhadores, tem se produzido, nos anos 90, uma separação entre os intelectuais críticos, inspirado em idéias e teorias consideradas revolucionárias, e os dirigentes políticos que estão mais diretamente ligados à base social capaz de produzir as transformações desejadas. Aqui se tem uma produção teórica que é fruto das lutas cotidianas concretas, que mistura depoimento e vivência pessoal com análise política e com teoria política e social, algo raro num país onde a universidade e a intelectualidade – mesmo a de esquerda - ainda se mantém muito distante das massas populares.
Os dilemas apresentados por Oséias e Burato são muitos, e os desafios são gigantescos, pois como será possível construir – e aplicar – um projeto de Segurança Pública Popular, Democrático e Comunitário, inspirado na ideia de que os problemas sociais não podem ser tratados como caso de polícia? Como isso será possível num país onde os municípios e seus prefeitos e vereadores, os estados e seus governadores e deputados estaduais, e diversos setores do governo federal (Ministério da Defesa, Polícia Federal, Exército, Marinha, Força Aérea, ministros de Estado, etc.), bem como grande parte dos deputados federais e senadores (sejam da base de apoio do governo ou da oposição ao governo), além da grande maioria de representantes do poder judiciário, das polícias, ainda tratam de identificar na legítima luta social dos mais pobres uma ameaça constante para “a segurança pública”, para a “segurança nacional”, para o chamado “Estado Democrático de Direito”.
Será possível garantir uma transformação no interior das Guardas Civis Municipais sem que ocorra uma significativa alteração na correlação de forças a favor de outros setores da classe trabalhadora? Como fazer retroceder e impor derrotas a uma concepção anti-democrática e anti-popular de segurança pública que ainda é predominante em muitas instituições que ainda não se libertaram do recente passado repressor e autoritário, marcado pela ditadura civil-militar que entre 1964 e 1984 transformou os movimentos e partidos proletários e populares em verdadeiros “inimigos internos”?
Quais as possibilidades concretas de transformar as intenções de setores do governo federal em realidade, em uma série de iniciativas no sentido de defesa dos direitos humanos e do respeito à livre manifestação e organização dos trabalhadores e trabalhadoras?
O que pensa o governo federal, quando manda tropas para o Haiti? Ou quando desencadeia uma verdadeira caçada contra os pobres nas favelas do Rio de Janeiro (em aliança com o governo estadual), institucionalizando a violência policial e justificando massacres e assassinatos de cidadãos para satisfazer os anseios de uma classe média e burguesa cada vez mais egoísta e amedrontada com a possibilidade de perder seus bens materiais? Caveirão, polícia repressora, ocupação militar de bairros/favelas, mandados judiciais coletivos, permitindo a violação de casas de trabalhadores, soldados do exército que invadem favelas e roubam os moradores durante ocupação militar, jovens da periferia constantemente assassinados pelas polícias, impunidade, diante de tudo isso e muito mais, como proceder com dignidade, como manter uma posição justa e humana diante de tantos conflitos, sendo um profissional da Segurança Pública?
O que fazer diante uma ordem de despejo contra uma ocupação de sem terra e sem teto? O que significa, de fato, a democratização da instituição Guarda Civil Municipal?
Questões, desafios e dilemas que os próprios autores nos ajudam a compreender, quando afirmam que “os trabalhadores (...) devem investir na organização, na unidade da categoria, para constituir uma correlação de força que possibilitará alcançar suas reivindicações”.
Também acreditamos que só a auto-organização dos próprios trabalhadores e trabalhadoras, sejam servidores públicos, Guardas Civis Municipais ou de outras categorias e/ou subcategorias, pode contribuir na resolução dos problemas fundamentais que afetam o cotidiano desse conjunto de homens e mulheres que são hoje responsáveis pela proteção do patrimônio público municipal e também dos munícipes em diversas regiões do país.
Se a tendência desejada pelos autores é o fortalecimento do papel das Guardas Civis Municipais enquanto protagonistas dessa possibilidade de construção alternativa, dessa nova concepção de segurança pública, com ênfase na educação, na conscientização e na aliança e participação ativa dos movimentos sociais proletários e populares na definição dos rumos dessa política, então é indispensável melhorar a capacidade de organização e de mobilização desse setor, fortalecendo e participando mais intensamente dos sindicatos e outros espaços organizativos, dentro e fora dos locais de trabalho.
Fortalecer as lutas e organizações que hoje podem ser consideradas como as legítimas representantes das Guardas Civis Municipais, criar novos instrumentos e ferramentas onde for necessário, ir criando as condições para construir e consolidar a unidade entre as diversas Guardas de uma mesma região, tendo como perspectiva fortalecer as lutas em nível estadual e em nível nacional.
Na história do Brasil as categorias e movimentos que obtiveram conquistas e vitórias começaram localmente, mas se fortaleceram e alteraram a correlação de forças quando se tornaram um movimento político e social de massas, de caráter nacional, com jornadas nacionais de mobilização em defesa de uma pauta de reivindicação comum, e com o apoio e em aliança com outros setores da sociedade.
Enquanto dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra-MST, só temos a desejar para Oséias, Burato, para os sindicatos de servidores públicos que tem em sua base Guardas Civis Municipais, e para todos esses lutadores e lutadoras que querem verdadeiras e efetivas transformações sociais, que sua luta se fortaleça, e que suas conquistas sejam um estímulo para a construção desse legítimo movimento nacional proletário, popular, democrático e de massas.
Queremos ver as Guardas Civis Municipais nas ruas, protegendo nossas crianças nas portas das escolas, mas também protestando em defesa de seus direitos, pois assim, juntos com o povo pobre e trabalhador, vocês também serão parte desse nosso sonho de viver num país e num mundo mais justo, mais democrático e verdadeiramente humano, aquilo que chamamos de sociedade socialista.

* Marcelo Buzetto (Doutor em Ciências Sociais – PUC/SP, professor do Centro Universitário Fundação Santo André e da Escola Nacional Florestan Fernandes-ENFF, membro da Direção Estadual do MST/SP).


 
Oséias Francisco da Silva
Especialista e Consultor em Segurança Pública
Pós Graduado em Gestão de Segurança Pública
Pós Graduado em Gestão de Pessoas e Políticas Públicas
Filósofo
Psicanalista
Escritor
Twitter: @oseiasfilosofo
"A segurança é indivisível. Ou existe igual segurança para todos ou não há segurança para ninguém. ( ... ) A segurança de cada nação depende da segurança de todos os membros da comunidade humana."
 (Mikhail Gorbachev)
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